Uma semana
sem uma empregada doméstica me permite a consciência de que esse texto será
provavelmente tendencioso, considerando certo rancor que ando alimentando por
essa categoria específica.
Adianto que
sou e sempre fui uma patroa generosa, pontual no pagamento e bastante compreensiva
e flexível. Aliás, do ponto de vista dos empregadores, sou uma anátema na
categoria “patrão”, mas isso tudo não garante encontrar e manter uma boa
funcionária, não importa o quanto se disponha a pagar.
Acredito que
a profissão de “empregada doméstica” deva estar em extinção, ao menos no seu
papel mais notório que é cuidar de uma casa, que consiste em limpar e organizar
a tal, cozinhar para a família, lavar e passar roupas. Pelo menos era assim que
faziam as empregadas de “antigamente”.
Atualmente, ao
tentar contratá-las, elas já trazem consigo um inventário de exigências, que antes
era prerrogativa do patrão. São elas que escolhem os dias que podem, o horário
e o tipo de serviço que querem fazer.
Estão se “especializando”,
se é que podemos assim descrever. Ficando parecidas com médicos. Se eu quiser
alguém que passe roupas, terei que contratar uma “passadeira”, pois quem cozinha
não lava, nem passa. E o antigo trocadilho vira realidade.
Que fique
claro que essa “particularização” dos serviços, não significa benefícios na
qualidade do trabalho. Muito pelo contrário! Por algum motivo que não atino, essa
qualidade vem piorando consideravelmente. Um declínio vertiginoso, diria.
Mudando um
pouco o foco, tenho para mim, que minha família me acusa de ser “boazinha”, demais.
Dizem que é por isso que minhas empregadas “deitam e rolam”. Também sou culpada injustamente
de fazer uma pré seleção cujos requisitos são “feiura”, “ignorância” e “incompetência”.
Como explicar
que não consigo achar nada melhor?
Quem eles
querem, afinal? A Gisele Bündchen lavando nosso banheiro enquanto declama Edgar Allan Poe?
O fato é que
mesmo feias, ignorantes e/ou incompetentes, está quase impossível manter uma
empregada por muito tempo.
Só sei que nos
últimos tempos andei aceitando qualquer pessoa que quisesse trabalhar como empregada
doméstica na minha casa, sem nenhuma exigência, referências, nadica de nada...
Nem assim!
A minha
penúltima “secretária” como gostava de ser chamada, escrevia totalmente errado
na lista de compras. Quantas vezes eu comprei alho no lugar de óleo, e por aí
vai... No entanto, conhecia toda a legislação trabalhista concernente à profissão
de “doméstica”. Sabia cada artigo, item, emenda, adendo... Sabia de todos
os seus direitos, melhor que qualquer advogado. Dava até assessoria às colegas do
bairro.
Deveres? Essa
parte ela não se interessou em ler.
Chegava
atrasada, fugia antes do horário, faltava, fazia tudo correndo e mal feito, e
assim, por pressão da família tive que dispensá-la, não sem antes sofrer um
desfalque nas contas.
Mal sabia que
podia piorar.
E sabem o que
aconteceu?
Piorou!
Se a
penúltima escrevia errado, a última que consegui arrumar não sabia nem escrever.
Ler tampouco. E ainda tinha raiva de quem sabe. Uma analfabeta convicta.
Senti pena e
me propus a ensiná-la, depois do expediente, ao que ela rebateu insultadíssima
que aquele era o horário da hidroginástica dela.
Então tá,
ué...
Todo mundo
tem o direito a escolhas.
Depois, para
que eu preciso de uma pessoa alfabetizada em casa? Eu só preciso
de alguém que faça uma comidinha caseira para três pessoas e passe a maldita
pilha de roupas que não para de crescer, enquanto os guarda-roupas esvaziam.
Alguém que mantenha a casa mais ou menos organizada e me engane que limpou,
pois eu trabalho fora em período integral e só quero ter paz ao chegar.
No entanto,
essa se superou no quesito “pior dos piores do mundo”. Era grosseira ao atender
ao telefone, e além de não anotar o recado (óbvio), também não se lembrava do
nome de quem ligou ou o que queria.
Uma lista de
compras a essa altura dos acontecimentos, era um luxo que não mais me pertencia.
Meus
familiares me fitavam zangados todos os dias porque a comida era uma “gororoba”
intragável, e além de cozinhar mal, a dita conseguia fazer uma baderna colossal
na cozinha durante o processo. Totalmente desordeira e atrapalhada. Jamais vi
nada parecido.
Nossa hora do
almoço era um caos.
Confesso que
tive ganas de fugir de casa ou passar a comer fora, esquecendo que eu é que sou
a mãe.
A geladeira entulhada
com dezenas de potinhos, cada um guardando um resto de alguma coisa que jamais
seria reaproveitada: uma fatia de tomate num, uma azeitona noutro, um restinho
de molho, um pedaço de frango velho, elementos não identificados, etc.
Não
satisfeita com tanto defeito, ela se dava ao luxo de ser mandona, se intrometia
nas conversas da família, não gostava dos animais e para fechar com chave de
ouro, reclamava da empregada anterior, que eu, saudosa já comparava a uma
governanta britânica.
Quando ela se
queixou (quase dois meses depois de contratada), que o chão da cozinha estava
sujo porque a outra empregada não limpava, eu tive a audácia de dizer que agora
era ela quem tinha que fazer isso. “Fuzilou-me” com um olhar que variava entre furiosa
e estupefata.
Quase fui limpar
o chão eu mesma.
Mas de
números ela entendia! Tinha dois celulares e ligava o dia inteiro sei lá para
quem.
Mesmo com
toda a família contra mim, cheguei a defendê-la, só para não ter que recomeçar todo
o processo de procurar, entrevistar, contratar, ensinar...
E ainda
assim, o inesperado aconteceu.
Ao receber
seu terceiro salário, sem aviso prévio, sem despedidas, sem sequer uma carta de
adeus, ela se foi...
Já faz uma
semana que não vem trabalhar.
Ao ligar para
casa dela para obter notícias, não me atendeu e mandou recado pela filha. “A mãe disse que não quer mais trabalhar aí
porque vocês são muito desorganizados.”
É isso aí.
8 comentários:
Sensacional! O celular que não para de tocar (com toques de músicas sertanejas) é a melhor parte! Eu tb me pergunto "que tanto assunto ela tem para falar neste celular?". Mas aí me lembro que, antes do celular, ela usava meu telefone fixo... então, fico feliz da vida por ela usar seu próprio meio de comunicação. Já que tem que falar, que faça com seu dindin e não com o meu. hohoho. Paula do Paulo
A questão do celular é sintomática...
Aliás, TODAS as demais também o são!
Não falta nenhum condimento neste prato delicioso: sentido crítico, mordacidade, ironia, sentido de humor...E que bem que ele é servido de graciosidade, de divertimento!...
Filha de peixe sabe nadar. Eu diria que já vinha a nadar dentro do ventre.
Parabéns, prosadora exímia.
Outro beijo.
Caramba, achava que todos estes defeitos eram somente das minhas funcionárias, aliás, estava quase indo para a análise, eu tinha certeza que a culpa era minha....rsrsrs
Essa dos direitos e deveres é o meu lema...!!!
Abraços
Adorei!!!!!! Por enquanto, a minha ainda está fora destes padrões, mas está muito difícil mesmo...bju amiga!
Adorei este blog! Parabéns :)
adorei seu texto realmente vç retratou o cotidiano dessa gentalha sem era nem beira. tenho saudades do tempo de criança qdo essa gente era tratada de forma bem subalterna e que so ia a sala qdo eram requisitadas . hoje fazem tantas exigencias e sabem tudo de lei então esta na hora de ser criada p elas uma escola de formação domestica com direito a diploma e tudo e dessa forma pode ser contratada como funcionarias e ser tratadas como tal e ser do jeito levar a comida de casa como qualquer operario . helena
Aposto que você paga uma miséria pra suas funcionárias. Você quer tudo do seu jeito, né? Então ou faz você mesma ou paga mais, pq assim não dá!
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