sexta-feira, 13 de julho de 2012

O rabugento





        Passava dos setenta e morava no interior.
Violeiro competente, e além de ser comerciante era também um político atuante na cidadezinha.
Conforme se soube, o velho era sistemático, teimoso, e por que não dizer, um caipira rabugento.
Como se tornou político tendo essa conduta antipática é uma incógnita. Um enigma, aliás, para quase todos os políticos desse país
        E cá entre nós, soube que o tal era meio transtornado.
       Imaginem vocês, que eventualmente cercava a própria loja com fita de isolamento “zebrada” de amarelo e preto, vedando a entrada de clientes.
Daí sentava-se na porta e tocava viola o dia inteiro.
Azar se alguém quisesse comprar alguma coisa. Ali não entrava!
    Incontáveis às vezes em que deixou o cliente experimentar, examinar e escolher uma peça. Na hora do “vou levar”... Não levava! O velho não vendia. Ou por que só tinha uma peça. Ou por que não foi com a cara do freguês, ou por qualquer motivo que lhe desse na telha.
Birrento.
Não vendia e pronto! Louco ou não?
     Contam que quando visitou a viúva de um correligionário que inexplicavelmente cometeu suicídio, inquiriu contumaz à inconsolável:
- Foi formicida?
- Não. Respondeu a viúva. – Foi “Diabo Verde” (Um ácido desentupidor).
- É “bão” também! Filosofou...
      De vez em quando se “arvorava” a passear de bicicleta pela cidadela. Sempre com o cenho fechado e cara embirrada. O delegado da cidade, que era velho conhecido, o chamou um dia quando estava dando suas pedaladas:
- Que foi, seu delegado? Por acaso tô sendo preso? Indagou o invocado.
- Que nada amigo, só queria dar uma voltinha nessa bicicleta. Posso? Perguntou o delegado.
- É claro que não! De jeito nenhum! Se “ocê” me rouba a bicicleta eu vou dar queixa pra quem?
        Existe coerência...
        Ah sim! Ele tinha um temor de voltar sozinho para casa quando estava escurecendo, já que morava afastado do centro urbano.
Se não tinha companhia - o que era habitual devido a sua ranhetice - ia entrando de bar em bar para ver se topava com algum “vizinho”.  
Assim se detinha em todos eles, que não eram poucos e tomava uma cachaçinha para “não fazer desfeita”. Só ia para casa quando o teor alcoólico ficava maior que o medo.
      Dormia embriagado todas as noites, o que talvez explique seu constante mau humor:
Pura ressaca.

domingo, 8 de julho de 2012

Ano eleitoral




A passeata passeia.
Trânsito congestionado...
Dois amigos compartilham carona.
- O que é agora? Outra passeata?
- São os invasores das casas daquele conjunto da Prefeitura.
- Cada dia é uma coisa diferente. Tenha dó!
- Ano eleitoral...
Trânsito congestionado...
- Ai minha paciência...
- São muitas as reivindicações...
- Mas já não faz um tempão que eles invadiram?
- Faz.
- Então o que mais eles querem?
- Sei lá! Vai ver, querem regularizar a situação. Quer sair do carro e ir lá perguntar?
- É ruim, heim!
- Ano eleitoral...
Trânsito congestionado.
- Tá vendo aquele moço, lá?
- Qual moço?
-Aquele de camiseta vermelha.
-Tá cheio de gente de camiseta vermelha.
- Aquele ali ao lado da mulher com o megafone.
- Sei qual é.
- Então, ele estava naquela manifestação de ante ontem.
- Na outra passeada?
- É!
- Aquela dos aposentados?
- Hum hum...
-Mas nem idoso ele é!
- Pois eu me lembro dele muito bem. Era o mais animado e indignado da passeata.
- Ano eleitoral...
Trânsito congestionado...
- Vou chegar atrasado do almoço de novo!
- O que ele está fazendo nessa aqui também?
- Sei lá! Vai ver que gosta de passear e gritar pela rua, ou então o pai aposentado  invadiu o tal conjunto residencial...
- Tá me gozando?
- Na verdade, é só algum candidato da oposição.
- Como você sabe disso?
- Ano eleitoral...