Numa dessas noites, eu quase dormindo, chega
minha filha da faculdade e me confessa assim de supetão: - Sou pouco sociável, mãe!
Como
assim? Ela é linda, fofa, inteligente, e... Calma mãe... Menos...
Refreio
meu lado coruja louca e deixo que continue:
-
Não é que eu não queira me socializar, é
que o empenho não vale a pena. Não sou do tipo gostável e teria que me esforçar
muito para que gostassem de mim, e não sei se quero ter que fingir.
É
duro ver um filho sofrer por não ser aceito facilmente pelos grupos. Já quero
logo dizer que “eles” é que são estúpidos, ignorantes, etc., etc., mas me
contenho.
Reflito
melhor sobre o assunto e reconheço que minha menina tem toda razão! Não em
reconhecer-se “não gostável”, mas em não querer forçar a barra para isso
acontecer.
Já
incorri muito nesse erro.
Não
exatamente em “fingir”, mas em tentar mudar quem sou para ser aceita. Grande
parte da minha vida eu fiz muita questão em agradar as pessoas.
Que
tolice...
Demorei
uma existência para saber o que minha filha já percebeu aos vinte anos. Nunca
vamos agradar a todos. Nem que nos esforcemos muito e nos forcemos a ser quem
não somos.
Vale
a pena?
Hoje
percebo que não!
Até
porque, não há muito que fazer, quando alguém não gosta de você. É uma questão
de energia. Mesmo que se empenhe, ajude, ampare e se desdobre, é muito custoso
transformar um sentimento.
Até
pode acontecer, mas minha experiência me mostrou que é muito incomum. Fui
aprendendo com o tempo e com meus próprios sentimentos de rejeição para com outros
que nunca me fizeram mal.
Quantas
vezes ajuizei uma pessoa pelo que ela aparentava ou por que se semelhava com
alguém desagradável, a voz me lembrava de alguém irritante, ou tinha os
trejeitos de um indivíduo perverso que conheci lá atrás...
Por
vezes rejeitei pessoas por puro instinto, ou intuição. Chamem como quiserem.
Fica
muito difícil gostar de alguém nessas circunstâncias. Requer esforço e trabalho
íntimo árduo, e acreditem que eu sou dessas que tenta suplantar sentimentos de
rejeição e ver o melhor das pessoas. Uma Pollyanna incorrigível...
Assim, isso também acontece
com os outros em relação a nós. E nem todos tem disposição de tentar gostar,
compreender e tentar enxergar nossas qualidades.
Somos
julgados muitas vezes por sermos antipáticos ou por excesso de simpatia, por
falarmos pouco ou muito, pela voz estridente, pela cara que temos, pela roupa
que usamos, pelas nossas preferências de toda ordem...
Somos
julgados o tempo todo e fazemos o mesmo, às vezes inconscientemente.
Em
compensação, uma coisa muito extraordinária pode ocorrer.
Quantas
vezes conhecemos alguém que nos desperta afeição de pronto, e amamos assim do
nada? É uma experiência sensacional que compensa tudo o que registrei acima. É o
encontro de almas afins, que compartilham bem querer e afeto sem muita
explicação.
É
certo que as relações humanas são mais profundas que o simplório “gostar” ou “não
gostar” de alguém, entretanto, é um ponto de vista muito relevante.
Enfim,
essa precisão de ser aceito e amado é um sentimento muito humano, no pior sentido
em ser humano, pois tem muito a ver com vaidade e pretensão de se achar merecedor.
Por
que queremos tanto ser amado?
O
que acontece com nosso coração ao receber afeto, e que benefícios isso nos traz além da terna alegria
dessa bem querência?
Não
tenho a resposta. Entretanto desconfio que tudo se trate de poder.
O
carinho, o amor, o afeto, a admiração, todos esses sentimentos carregados de
energias positivas, direcionados a nós aumenta nossa autoestima que nada mais é
que uma satisfação com a própria identidade, mas penso que tem mais a ver com a
necessidade de atendimento de todas as vontades. Isso é necessidade de poder...
Mas
voltando à minha filha, que é quem suscitou toda essa reflexão da minha parte,
tenho a convicção de que ela está certa, e não vale a pena tentar ser gostada a
força.
Não
vale a pena desistir da dignidade por qualquer deleite, porque o bem estar em
ser autêntico é o maior dos prazeres.
Não
vale a pena transformar-se em uma pessoa que não é por coisa nenhuma.
Isso
serve para todos nós.
O
importante é sermos espontâneos sem perdermos a educação. Podemos ser genuínos
e ainda assim sermos gentis, só não devemos mudar nossa essência para agradar
outros, porque podemos nos perder nesse caminho e esquecer quem somos.
Isto
posto, compartilho aqui a conclusão das minhas ponderações: É possível
continuar vivendo sem agradar todo mundo.
É
possível sobreviver à rejeição.
Hoje,
continuo tentando aceitar o outro, mas não faço mais questão de aquiescência ou
amor, apesar disso me fazer um bem enorme.
Só
não é possível para ninguém viver sem respeito e isso eu pratico e exijo e sempre
ensinei minha filha a fazer o mesmo.